Artificial Insanity #1
Um artigo sobre IA, mercado de trabalho e a sociedade do futuro.
O deep dive de hoje está em um formato diferente.
Poderia ser uma conversa de bar, uma sessão de terapia, uma série de pensamentos daqueles que vem quando estamos correndo ou até mesmo um episódio de Black Mirror.
A ideia central desse experimento é falar sobre mercado de trabalho x IA.
Mas, para isso, vamos trazer questionamentos importantes e, com sorte, ajudar o leitor a se posicionar frente a tudo que está acontecendo!
Aproveitem, mas antes, se inscrevam! =)
Prefácio
O avanço e adoção da IA tem trazido grandes dúvidas sobre o futuro do mercado de trabalho.
Para um grupo que vou chamar de early adopters & heavy users, é quase consensual que a IA os torna mais produtivos;
Para o grupo dos light users, a IA torna o seu dia mais fácil, mas não necessariamente mais produtivo;
Por fim, temos os negacionistas, que aos poucos estão se curvando para usar alguma coisa de IA na sua rotina, mas claro, reclamando bastante do seu resultado.
Independente de qual grupo você se encaixe, para o mercado de trabalho, todos representam apenas uma entrada na folha de pagamentos no final do mês.
E sob a ótica das empresas?
Temos as que estão vendo tudo acontecer mas não sabem por onde começar;
Algumas estão buscando formas de implementar IA em suas linhas de produção, buscando otimizar e aumentar a eficiência dos seus processos, seja via desenvolvimento interno ou contratação de ferramentas terceiras;
Algumas, mais avançadas, já contam com IA em diversas frentes da empresa;
Casos mais “extremos” como o Shopify também emergiram recentemente, onde para se contratar alguém, é necessário provar que essa tarefa não pode ser desempenhada por uma IA;
Por fim, temos um grande punhado de empresas que, ao colocar apenas IA no nome, acreditam estar prontas para ser o próximo Google.
Estamos apenas no começo de uma história de amor e ódio quando o assunto é inteligência artificial, e enquanto os capítulos desse livro estão sendo escritos, já podemos pensar em spoilers para o desfecho dessa história.
Bem distante de um romance de TV, estamos mais próximos de um belo script de Woody Allen, onde alguns darão risadas, outros despejaram lágrimas, mas no fim todos terão vivido um grande história, cheia de personagens e sem um protagonista.
O vilão e o mocinho vão ser escolhidos individualmente e cuidadosamente pelos ávidos leitores dessa obra, onde a única certeza é que, diante a muita confusão literária, as convicções mudarão a cada capítulo.
Capítulo 1: The Beginning Is the End Is the Beginning
“There's no more need to pretend
'Cause now I can begin again”
Dos mais céticos aos mais entusiasmados, todos compartilham pelo menos um pequeno receio do impacto no mercado de trabalho da “temida” AGI.
Poder contar com um prêmio nobel no seu time, sem precisar para isso desembolsar centenas de milhares de dólares parece um tanto tentador. Se adicionarmos a essa equação as variáveis tempo - visto que podemos contar com ele 24 horas por dia, 7 dias na semana - e risco, pois ele nunca deixará o cargo, fica quase impossível pensar um mundo onde esses não serão os trabalhadores mais cobiçados das empresas.
Diferente de uma corrida de carros ou até espacial, a busca pela AGI virou uma verdadeira guerra política entre EUA e China. Mas, quando o assunto é mercado de trabalho, pouco importa quem chegará lá primeiro, pois essa tecnologia impactará a todos mais cedo ou mais tarde.
Capítulo 2: Any Given Sunday
“And, either we heal, now, as a team, or we will die as individuals.”
Enquanto grandes impactos no mercado ainda, de fato, não tem sido observados, tem se tornado cada dia mais de senso comum que, por mais que uma IA não roube nossos empregos, um profissional que domine IA irá ocupar esse espaço.
Diferente de aprender um idioma ou uma linguagem de programação, para começar a brincar com IA basta, literalmente, começar.
É simples, grátis e pode ser muito divertido!
O maior desafio da nossa geração será aprender a trabalhar conjuntamente com uma IA.
O episódio de Black Mirror onde, humanos e IA’s trabalham juntos, em diferentes hierarquias, já está com mais cara de realidade do que de ficção.
Desde que comecei por aqui, um dos principais temas da minha Newsletter vem sendo trazer as questões de impacto da tecnologia, como um todo, em diferentes segmentos da industria.
Quando trazemos um desfile de moda, onde as roupas são telas, estamos aqui provocando qual será o futuro do design contemporâneo.
Todas coberturas de feiras e eventos tech são feitas com um objetivo muito além de trazer os futuros objetos de desejo dos leitores. O objetivo aqui é que a gente pense no impacto que isso terá no padrão de consumo atual.
Tudo está aqui por um motivo e, nesse caso, não será diferente.
Assim como no role-playing game (RPG), essa história pode tomar diversos rumos diferentes, nesse caso definidos pelas respostas que daremos a algumas perguntas, e não pelo lançamento de dados de 20 faces.
Aonde a IA se posicionará nas equipes de trabalho? Estamos caminhando para fluxos automatizados por IA, onde o diferencial do trabalho humano será na revisão, supervisão e criatividade? Ou chegaremos no estágio da uma IA tão mais inteligente que, caberá a nós, executar as poucas tarefas e apenas “assinar embaixo” do que será planejado por ela?
Com tantas IA’s “por aí” consumindo conteúdo para o treinamento de modelos, em quanto tempo seremos vítimas do nosso legado?
Habitaremos um mundo onde as ideias se tornarão cada vez mais uniformes, quando mais e mais conteúdos forem 100% produzidos por IA’s?
Como iremos dividir o espaço entre equipe humana e IA ainda não sabemos. Essa, por exemplo, é a percepção do CEO da Microsoft sobre isso:
“O novo fluxo de trabalho para mim é: penso com a IA e trabalho com meus colegas.” No que diz respeito à descoberta de ideias, também percebi que colaborar com um LLM é mais produtivo do que fazer isso com a maioria das pessoas que conheço (salvo por alguns conversadores ultra inteligentes).
Capítulo 3: Ghost in the Shell
Section 9 Department Chief Aramaki: What is it? Artificial intelligence?
Puppet Master: Incorrect. I am not AI. My codename is project two-five-zero-one. I am a living, thinking entity that was created in the sea of information.
A questão não é mais se será impossível distinguir o humano do artificial, mas sim, quando.
Acreditamos que, em 2026, já será impossível distinguir imagens geradas por IA de fotografias verdadeiras.
Já na esfera musical, hoje já fica bem difícil identificar uma música totalmente produzida por uma IA.
Ainda temos algo de muito valor do nosso lado: A criatividade.
Mas até quando?
Capítulo 4: Ruptura
"The surest way to tame a prisoner is to let him believe he's free."
"You don't value me. You fear me."
A série Ruptura aborda um futuro distópico em que funcionários de uma empresa passam por um procedimento chamado "ruptura", que separa suas memórias e consciências em duas identidades: uma para o ambiente de trabalho (Innie) e outra para a vida pessoal (Outie). Essa divisão radical elimina qualquer interferência entre as duas esferas, mas também aprisiona os "Innies" em uma existência exclusivamente dedicada ao trabalho, sem noção de tempo ou propósito fora dele.
“There's a gap in between
There's a gap where we meet
Where I end and you begin”
A série tem uma atmosfera de crítica em torno das relações pessoais e profissionais, e também em como equilibramos - ou deixamos de - nossa vida pessoal com a profissional.
Para sermos produtivos, precisamos nos isolar em um ambiente de trabalho inóspito e, para viver em harmonia, precisamos que nossa vida pessoal não tenha contato com esse local?
E se adicionarmos o elemento IA a este ambiente? Se a IA conseguir realizar parte deste trabalho, não precisaremos mais dessa dinâmica de trabalho. Mas, nesse caso, como iremos ressignificar o papel do ser humano no mundo?
Se engana quem pensa que essa é a primeira vez que a humanidade entrou nesse tipo de conflito.
Os Millennials passaram por um episódio similar nas últimas décadas.
Algumas profissões foram extintas, sendo substituídas por máquinas ou apenas por processos. Um exemplo relativamente recente, eram os profissionais que ficavam dentro dos estacionamentos na década de 80. Ao mesmo tempo que um leve pânico começou a se instaurar pela incerteza de “quais empregos seriam extintos”, máquinas estava ali para substituir um trabalho que era considerado por muitos nocivo a saúde.
Sem a variável saúde na equação, como iremos fazer essa distinção, mesmo que para nós mesmos?
Capítulo 5: Back to the future
A tecnologia tem avançado tão rápido que, em alguns dias, estamos vivenciando o futuro e o presente dentro das mesmas 24 horas.
E o que o futuro tem a dizer para o presente sobre como será o mercado de trabalho na era da IA?
Baseado nos capítulos anteriores, vamos começar com uma questão:
Mesmo que a IA não substitua grande parte do trabalho humano, com o mercado sendo inundado por modelos e ferramentas de inteligência artificial, vamos criar uma série de trabalhadores infinitamente mais produtivos ou mais deprimidos?
Enquanto os negacionistas da IA sentam e aguardam as respostas, modelos de LLM devoram todo conteúdo que existe na internet.
Profissionais hoje que produzem conteúdos para a internet são os grandes treinadores dos modelos de IA. Cada post ou vídeo que é lançado na internet vai ser rapidamente convertido em uma balinha para alimentar um modelo de LLM.
Dinheiro não é problema para IA. Infra, por enquanto, também não.
E os modelos estão ficando verdadeiramente bons em muitas coisas.
Mas, assim como na Matrix, a gente só consegue mostrar as portas, as pessoas que tem que atravessá-las.
E só vamos conseguir passar por essas portas, quando tivermos as chaves do conhecimento, que nesse caso é: Ser entendido por uma LLM.
Quando estamos escrevendo um código de programação, usamos códigos para instruir as máquinas a desempenhar determinadas tarefas.
Estamos agora entrando em uma nova era, encontrando novas formas das LLM’s interpretarem comportamentos humanos, a partir de janelas de contexto, prompts e comandos.
Falar com a máquina nunca foi tão fácil, mas fazê-la compreender é bem mais difícil do que parece. O segredo não está na pergunta, mas sim, em como obter a resposta!
Capitulo 6: Beat it
“You better run, you better do what you can”
Nessa altura da história, já estamos quase convencidos que vencer será impossível. Ao menos se considerarmos o sentido literal da palavra.
A pergunta que fica neste caso é: Como vamos nos diferenciar, com tudo que já sabemos até aqui?
E conforme vamos inserindo mais IA nas nossas vidas, entra mais um dilema que vou chamar de Mozart versus Kasparov:
Nos outros capítulos já mostramos que o conteúdo gerado por IA está tomando conta da internet. A medida que Elon Musk luta contra os bots no X, o LinkedIn está 100% tomado por longos posts feitos por IA. Em sites de notícia podemos ver também eventuais alucinadas claramente colocadas ali por um prompt. A dúvida que fica, neste caso, é:
A escrita com IA será mais parecida com música ou xadrez?
Ao escutar uma música, a grande maioria das pessoas não tem sua curiosidade aguçada pela forma com que ela foi produzida. O julgamento fica na superfície, onde o que é agradável para os ouvidos é bem recepcionado.
Já no xadrez, o espectador está ali para ver os grandes jogadores em ação. Isso acontece mesmo depois da emblemática partida entre Kasparov e o Deep Blue, em 1996. Mesmo tendo a certeza que hoje seria impossível manter um ritmo de vitórias sob um robô, milhares de pessoas lotam os auditórios em todas partidas oficiais de xadrez ao redor do mundo.
Com a proliferação dos robôs humanoides, é tranquilo pensar que eles irão nos superar em qualquer esporte nos próximos anos.
Metaforicamente falando, o futuro da escrita poderá seguir um destes dois caminhos, onde de um lado o leitor se importará com a forma que o conteúdo foi produzido, e de outro ele somente irá querer consumir aquele material.
Este tema já está sendo amplamente debatido, e o caminho que estamos seguindo parece ser esse:
A escrita de não-ficção vai seguir o caminho da música. As pessoas não vão se importar com como foi feita. Só vão querer que seja boa.
Com a IA na frente da produção de todo esse tipo de conteúdo, a preocupação que emerge é: As IA’s terão características próprias que as aproximarão de verdadeiros escritores ou entraremos em uma cultura homogênea onde tudo é meio parecido?
Hoje já temos formas de medir isso, e LLM’s diferentes já apresentam algumas características particulares, de acordo com seu treinamento.
Mas como ser mais criativo que a IA?
Rick Rubin é um dos maiores nomes mundiais da produção musical.
E ele não sabe tocar nenhum instrumento.
Seu trabalho, está em outra dimensão.
Podemos fazer um paralelo que o grande diferencial de Rubin para a música será o nosso diferencial para o mercado quando falamos de IA?
A lição disso é que não iremos conseguir aprender nem 10% do que a IA sabe. O que vai nos diferenciar não é isso, mas sim como vamos utilizar nossa criatividade para pensar em soluções e usar a IA para nos ajudar a implementar!
I’m a creep…
Podemos dizer então que o verdadeiro diferencial estará no pensamento humano, autêntico e diferente.
Vamos supervalorizar as “mentes únicas”.
E quando falamos que o diferente será super valorizado, o humanizado também. Um exemplo disso são os chatbots, pequenas criaturas que habitam a internet mas que ainda despertam a fúria de quem está do outro lado da tela com suas respostas pré programadas e sua incapacidade de gerar soluções úteis!
Modulando os ambientes
Como vamos então diferenciar o criativo do não criativo em um ambiente onde a IA faz tudo?
Se o que muda é apenas o interlocutor, mas o modelo continua gerando os conteúdos, será que conseguiremos ter conteúdos realmente autênticos, ou entraremos no paradoxo do Clube da Luta “everything is a copy of a copy of a copy”?
Dentro do universo da inteligência artificial, termos como destilação e fork já existem para classificar o que é realmente uma ferramenta ou o que é uma cópia com um look diferente.
Sinto dizer que, se sua estratégia é facilmente replicável, você provavelmente tem um problema nas mãos.
Mas, então, onde estará o verdadeiro valor das empresas?
Empresas de segmentos completamente distintos já possuem hoje um denominador comum quando o assunto é criação de valor: Base de usuários fiéis, ou, comunidade.
E na era da IA, isso é mais importante do que nunca.
A única coisa que pode salvar sua tecnologia de ser copiada e vendida com uma roupa diferente no mercado é uma fiel base de usuários!
Nubank, Uber, AirBnb, Spotify e até o WeWork. Empresas de segmentos completamente diferentes que, hoje, são unidas pelos usuários fiéis.
E o valor das pessoas?
“When you're working on a team, your primary goal is not to prove you're smart. It's to make problems go away.
Yes, the more knowledgeable you are, the better you're equipped to solve problems, but if your primary focus is peacocking your intellect then you're going to create problems instead of make them go away.
You don't get points for creating an unnecessary problem on which to demonstrate your smarts. You don't get points for creating an overcomplicated solution to a simple problem. You lose points for these things.
What you get points for is taking a problem and making it go poof, completely solved and easy to maintain and nobody has to think about it anymore.”
A combinação de conhecimento técnico profundo a engenharia de prompt promete ser um dos ativos mais valiosos na era da IA.
Hoje, escrever bons prompts pode te posicionar a frente de grande parte dos profissionais que utilizam IA.
Os hacks básicos de pedir para seu modelo de LLM favorito agir como um profissional de uma determinada área, pode destravar possibilidades e poupar horas de trabalho. Mas isso, em breve, ficará obsoleto.
Pessoas que tem conhecimento profundo de temas específicos, somado a uma vasta experiência profissional, podem se tornar os verdadeiros ativos para criação de aplicações específicas, que resolvem problemas reais e podem gerar economias e ganhos de eficiência imensuráveis.
Algumas questões para o futuro…
Os profissionais descritos anteriormente, trabalhando em conjunto com agentes IA e programadores, serão as próximas grandes empresas de consultoria?
Com todas IA’s habilitadas para buscar na internet, ler sites e trazer compilados completos dentro do seu próprio ecossistema, como iremos reconstruir os conceitos de site na internet?
Com o surgimento de micro aplicações que resolvem problemas reais desenvolvidas sem a necessidade de saber programar, quais empresas de software que irão sobreviver?
Com tudo podendo ser conectado via API, qual valor real de uma marca, se um usuário pode estar plugado no seu ambiente sem que necessariamente passe por dentro da sua plataforma?
O Google sempre foi o verdadeiro portal da internet. Essa classificação hoje está 100% ameaçada pelas LLM’s. Sem a necessidade de passar pelo Google para se chegar em algum lugar, como será o novo posicionamento de setores como anunciantes e empresas que tem grande parte dos seus consumidores adquiridos por estes canais?
Os conteúdos gerados por IA estão por todo lado. Hoje, grande parte deles ainda passa por uma supervisão humana, realidade que, aos poucos, deve mudar. O excesso desse tipo de conteúdo poderá tornar a internet um repositório de textos produzidos por IA, sem o elemento humano dentro do dese volvimento de cada ideia? Ou teremos IA’s humanizadas o suficiente para lidar com essa questão?
Obrigado a quem chegou até aqui, foi incrível colocar algumas ideias e questões no papel.
Vamos responder juntos a estas perguntas, estamos apenas começando!